Monica* estava orientando alguns alunos que trabalhavam em grupo num colégio da rede estadual do Rio de Janeiro quando sentiu um cabo de vassoura ser colocado em suas nádegas. Ela virou, mas os responsáveis pelo ato saíram correndo.
Um vigia descobriu os estudantes escondidos em outra sala. A professora fez um BO (Boletim de Ocorrência). Na delegacia, o incidente foi classificado como “ato obsceno”.
Em São Paulo, Ana* dava aula em um colégio estadual quando descobriu um desenho dela com teor ofensivo e sexual. A professora foi retratada em roupas íntimas, com os seios enormes e traços que aludiam sua raça negativamente. Ela é negra.
Três docentes da instituição de ensino em que Ana trabalha já haviam sido agredidos pelos alunos neste ano. Um deles foi assaltado e parou de dar aula na escola. Outros dois foram golpeados com voadoras. O primeiro, identificado como Luis*, está afastado há mais de seis meses com síndrome do pânico. O outro professor continua trabalhando.
Em uma carta enviada ao R7 Marina* conta que foi humilhada por um parente de um aluno na saída da escola. Tentando manter a ordem na sala até tocar o sinal, ela pediu para as crianças diminuírem a bagunça quando o indivíduo se exaltou e a xingou diversas vezes na frente dos pais e dos estudantes.
Outra professora paulista, socada por um estudante dentro na frente da turma, chegou a dar entrevista, mas voltou atrás e pediu para que sua história não fosse detalhada na reportagem porque “teme as consequências da divulgação da agressão”.
As histórias citadas acima mostram que a violência está cada vez mais presente no dia a dia das escolas do País. Uma pesquisa global feita pela OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) com 100 mil professores e diretores de escola de 34 países mostrou que o Brasil está no topo de um ranking de agressões dentro de insituições de ensino.
Na enquete, 12,5% dos professores ouvidos no Brasil contaram que são vítimas de ataques verbais ou de intimidação de alunos pelo menos uma vez por semana.
É o índice mais alto entre os países pesquisados — a média entre eles é de 3,4%. Depois do Brasil, vem a Estônia, com 11%, e a Austrália com 9,7%.
Outro levantamento realizado em janeiro pelo Instituto Data Popular a pedido da Apeoesp (Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo) destacou que quase metade dos alunos (44%) e mais de um quarto dos professores (28%) afirmaram que já foram vítimas de violência.
A enquete indicou um grau elevado de agressividade no ambiente escolar: (84%) dos professores e (77%) dos alunos afirmaram que tomaram conhecimento de casos de violência em suas escolas no último ano.
Punição
Em todos os depoimentos coletados pela reportagem, os professores lembraram que a falta de punição é um agravante que acaba estimulando os atos de violência.
No Brasil, menores de idade que cometem agressões e até assassinatos não respondem criminalmente. Eles são considerados infrações.
Martim de Almeida Sampaio, advogado e diretor de Direitos Humanos da OAB-SP, explica que qualquer ocorrência envolvendo crianças de até 12 anos vai parar no Conselho Tutelar. Atos praticados por estudantes com idade entre 12 e 18 anos incompletos são julgados na Vara da Infância e da Juventude.
— Dentro do Conselho Tutelar e na Vara da Infância as punições variam de advertências verbais, prestação de serviço comunitário até a apreensão em instituições de proteção de menores, como por exemplo, a Fundação Casa. Quando os praticantes são menores agressões e até homicídios não são julgados como crimes, mas como infrações.
O especialista comenta que atos obscenos e agressões verbais geralmente são punidos com advertências verbais e serviço comunitário.
A agressão física é classificada conforme a tipificação do delito. Em alguns casos os menores podem ser apreendidos em regime fechado ou semiaberto.
Se praticarem atos graves, como por exemplo uma tentativa de homicídio, os menores podem ficar apreendidos até os 21 anos.
Nas escolas, a prática comum é impedir a matrícula dos alunos agressores no próximo ano, pedir sua transferência e, em casos extremos, expulsá-los.
Denúncias
Os docentes contaram que falta de fiscalização destes incidentes nas escolas tira muitos professores da sala de aula. Eles disseram que, no geral, a orientação dada pela direção da escola é não denunciar o problema, fato que aumenta ainda mais a sensação de insegurança.
Mônica, agredida no Rio de Janeiro, relata que “a direção do colégio não queria que eu fizesse o BO porque isso ia ´denegrir´ o nome da escola. Depois que eu comuniquei a polícia do problema os casos de violência diminuíram.”
Ana também foi aconselhada a não registrar queixa. O aluno que fez a caricatura ofensiva era maior de idade e ela acabou perdoando. A docente disse que o rapaz se mostrou arrependido e, por isso, ela optou por "agir com o coração".
Outra professora disse que fez um boletim de ocorrência online, mas como não teve acesso aos dados do aluno o pedido foi indeferido.
Sampaio, que além de advogado já foi professor, relata que presenciou a demissão de um colega socado por um aluno em uma universidade particular. Neste caso o desfecho favoreceu o docente.
— Quando eu dava aula um colega foi agredido com um soco por um aluno e a instituição optou por demiti-lo. Fiquei indignado e pedi demissão também. Depois, entrei com uma ação criminal e trabalhista para defender o professor que venceu os dois processos.
O professor foi indenizado pela faculdade na Justiça do Trabalho. O aluno era maior de idade e foi julgado pelo crime de lesão coporal, mas pegou pena mínima.
* Os nomes citados nesta reportagem estão incompletos ou são fictícios em respeito ao anonimato dado aos entrevistados
Essa matéria foi tirada do portal R7 todos os créditos ao portal.
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